Invadindo Temecula - parte 3

A vinícola Falkner situa-se no alto de um morrinho bem próximo da Rancho California Rd. Seu restaurante, o Pinnacle, fica bem na beirinha do topo dessa morro. Local privilegiado realmente. Entramos e dissemos que iriamos fazer a degustação da casa, que ficava em frente, e voltaríamos em seguida.
 Na movimentada sala de degustação da Falkner, fomos atendidos por uma Colombiana simpática (também esqueci o nome). Pedimos apenas uma degustação e ela nos deu 3 taças. Imagine o quanto daria uma dose pequena de degustação dividida por três. Bem, ela não nos deixou imaginar, sendo bem generosa. Os vinhos da Fletcher são mais porradeiros, remetendo mais aos sul-americanos, o que agradou de imediato ao Polaco. E são bons. Quase todos os que nos foram servidos estavam bem redondinhos. Acabamos ganhando (ou comprando, já não me lembro também) uma bela taça da casa.

Voltamos para o Pinnacle, já bem vazio. Sentamos perto das janelas.

Com uma vista magnífica, pedimos os pratos e conversamos um pouco com a garçonete que nos servia. Ao saber que éramos brasileiros, engatou o assunto Copa do Mundo e nos disse que o chef do Pinnacle é um italiano tão louco por futebol que vinha todo dia trabalhar com a camisa do Milan por baixo do avental.
Pedi um dos meus pratos favoritos na América: pasta com "seafood". 18 Obamas. E uma taça do Chadornnay da Fletcher pra acompanhar. A garçonete vai até a cozinha com os pedidos e, minutos depois, sai de lá um sujeito com uma camisa rossonera e avental que vem até nossa mesa. Muito simpático, o Senhor Gianni conversou um bom tempo conosco sobre futebol. Milan, Robinho, Kaká, Copa no Brasil, Seleção italiana, Balotelli etc. A gente pensa que o brasileiro é o povo mais fanático por futebol no mundo e, ao viajar por ele, aprendemos que tem gente igual ou pior!

A comida estava excelente e o chardonnay amanteigado era exatamente o que eu esperava.


Partimos para a tal South Coast, que seria nossa primeira parada e acabou sendo a última. Belíssima propriedade. Estrutura de primeira e bastante gente no enorme salão de degustação. Pedimos apenas uma degusta, que dividi com o Polaco. Doutor só ia "na boa", poupando-se. A South Coast tem vinhos que, àquela altura, já não empolgavam. O que mais agradou,como não podia deixar de ser, foi o Zinfandel, do Vale de Cucamonga (já provamos um Zin de lá aqui). Esse o Doutor não dispensou. Quando viu que éramos três, o rapaz que nos servia também foi generoso. Eu achei que as outras vinícolas, de um modo geral, tinham caldos mais interessantes. Mas valeu a visita.

Fechamos assim com 5 vinícolas "invadidas" em Temecula. Excelente aproveitamento. E ainda ficou uma vontade de "quero mais".



Melhor... Assim a gente acaba voltando um dia. Quem sabe?




  B.         K.          7.          2.

Invadindo Temecula - parte 2

Depois de longa pesquisa, decidimos que iríamos de carro. Com Doutor de piloto, prometendo pegar leve. Nossa outra opção seria um tour que nos levaria a 3 ou 4 vinÍcolas e almoçaríamos uns sanduíches. Não era nossa idéia...

Antes de sairmos, reservei pela internet uma mesa no restaurante da vinícola South Coast Winery, que é uma das principais e cuja localização era estratégicamente boa pra nós. A partir dela, poderíamos visitar outras duas vinícolas próximas a pé. A princípio, esse era o plano.

Pegamos o carro e seguimos pela Rancho California Road, bela rodovia que é cercada pelas tais vinícolas de Temecula. Já estávamos passando por algumas, quando resolvemos parar em uma delas, pois o local era muito bonito. Havia um morrinho na parte superior, todo plantado. Havia outra propriedade ao lado, também muito bonita, de outra vinícola. Fomos nas duas.

A Primeira era a Baily. Muito arrumadinha. Como chegamos cedo, por volta das 10:00h, fomos os primeiros clientes do dia. Pedimos duas degustações, já que o Doutor estava de castigo. Os vinhos eram decentes. Mas com acidez um pouco acima do ponto e/ou tânicos demais, sugerindo bom potencial de guarda. Abrimos com um Riesling. Americano faz Riesling meio docinho. Até gostoso, mas não é o que esperamos num Riesling. O melhor vinho da vinícola era o M&M. Corte inusitado e certeiro de Merlot com Malbec. 50-50. Antes de sairmos, conhecemos o simpático enólogo. Contei que nós brasileiros, assim como os americanos, consumimos muito Malbec.

Partimos para a vinícola ao lado, que dava pra ir a pé. Europa Village Winery. Também muito bonita. A área externa tinha um jardim que parecia cenário de um conto de fadas. Os vinhos tinham uma pegada totalmente diferente. Bem mais leves. Se na anterior havia influência da Argentina, nessa, a Espanha e a Itália eram a referência. Tempranillo era o melhor. Bons vinhos. Mais elegantes e prontos pra consumo.

Seguimos pela nossa estrada encantada e paramos na Bellavista. A mais antiga da região de Temecula. Fomos atendidos por uma senhora húngara muito simpática. O salão de degustação era enorme. Pegamos duas degustas de 10 Obamas cada. Com direito a uns petiscos. Os vinhos foram uma bela surpresa. O mais novo era de 2004. O lance da Bellavista é só oferecer vinhos já com alguma evolução. Todos eram bem bons. E em todos podíamos sentir essa característica. 
No final, veio um "port". Não é a primeira vez que vemos isso na Americolândia. Bem, era doce... Mais melado que um Porto normal. A simpática húngara (infelizmente não anotei seu nome) conversou bastante conosco. Tanto que nos indicou um outro restaurante para o almoço. O Pinnacle, na vinícola Falkner. "O restaurante da South Coast é muito caro e não é tão bom. O Pinnacle ainda tem uma vista incrível".


Ok, partiremos então para a Falkner e daremos um bolo na South Coast na terceira parte da nossa invasão. Não perca!




B.     K.     7.     2.

Invadindo Temecula - parte 1

Uma feliz coincidência fez com que fosse possível uma nova invasão à uma região vinícola americana em novembro passado. Mais uma vez, eu tinha meu congresso anual na Califórnia nessa época. E o Doutor, tinha um congresso em Dallas. Aproveitamos então para convencer o Polaco a ir conosco, com a prerrogativa de que, após os compromissos profissionais, invadiríamos Temecula.


Essa é uma região vinícola relativamente nova que fica ao sul da califórnia. Longe das famosas, mais ao norte. Pra se ter uma idéia de sua localização, a cidade de Temecula fica, indo para o sul, a uma hora de carro de Anaheim, a cidade onde fica a Disney californiana. A cidade de Temecula possui aproximadamente 100 mil habitantes, uma estrutura para turismo bem razoável. Existe um bom número de hotéis, porém são poucas as opções de tours pelas vinícolas.
 
Eu nunca tinha ouvido falar da região de Temecula. Quem me alertou para sua existência foi o Sr. Woody, que já começava a ouvir coisas boas a respeito do local. O Sr. Andy mesmo ja esteve por lá num curtíssimo período.
Comecei a pesquisar então sobre a região, que produz de tudo! Não tem uma uva ou um estilo em particular que lhe traga algum hype fácil. Reservei um hotel próximo a Old Town Temecula. Um centrinho com arquitetura toda no estilo do velho Oeste. Muito bonitinha a rua principal. Vários estabelecimentos com Wine tastings. O único grande problema da cidade seria, imagino eu, os ataques de zumbis à noite. Pois às 9:00 PM nada mais funcionava em Old Town Temecula.

Às 10:00PM era impossível pegar um restaurante aberto e já seria possível ver os rolos de feno atravessando a rua. Creio que às 11:00PM são iniciados os tais ataques zumbis. Não pagamos pra ver. Doutor não quis se arriscar e ficou no hotel. Eu e Polaco achamos uma lojinha que fazia pizzas na hora e pegamos uma. Chegamos no quarto às 10:15PM com nossa pizza de pepperoni debaixo do braço. Uma boa margem de segurança...

 
Na segunda parte, começaremos os trabalhos propriamente ditos. Visitando as vinícolas da região.

B.  K.  7.  2.

Brasil na Taça: O Pinot Noir da Aurora


Neste segundo post sobre vinhos brasileiros vou falar um pouco do Pinot Noir 2013, da Aurora. A vinícola, aliás, foi a grande surpresa da visita que fiz recentemente à Serra Gaúcha. Antes dessa experiência, por absoluto preconceito, jamais compraria vinhos daquela que assina o Sangue de Boi e o Saint Germain.
Provei oito excelentes rótulos, incluindo espumantes, brancos e tintos. Mas os grandes daquela manhã foram o Chardonnay 2012 e o Pinot Noir 2013, resultado do trabalho que vem sendo desenvolvido em Pinto Bandeira, uma região próxima à Bento Gonçalves na qual a Aurora tem apostado alto e que é uma das quatro Indicações de Procedência (IP) já atribuídas aos vinhos finos brasileiros.
A vantagem de estar no topo da serra (730 metros de altitude) e distante 100 km da costa é que as videiras sofrem a incidência das correntes marítimas durante todo o dia, e isso as deixa livre da umidade e, portanto, de doenças fúngicas. Outro detalhe é que apenas entre 30 e 50 centímetros separam a superfície do solo das rochas basálticas de origem vulcânica que caracterizam o terreno da região, responsáveis pela mineralidade dos vinhos produzidos ali. 
É o que diz o enólogo André Perez Jr, contrariando alguns geólogos que recentemente passaram a defender que o que se percebe como mineralidade num vinho não vem do solo. Comprovado isso, imaginaem se os produtores de Chablis tiverem de mudar seu discurso centenário! 
As grandes variações de temperatura, própria dos climas de altitude, com noites frias e dias quentes, contribuem para a maior concentração de aromas da fruta. Também favorecem uma maturação gradual e lenta, fazendo com que os teores de ácidos e açúcares cheguem altos no momento da colheita, o sonho de todo enólogo. 
As 6500 garrafas de Pinot da safra 2012 acabaram em dois meses e meio. A que provei era uma das 10.000 produzidas em 2013, ainda disponível no mercado por 38 reais. Um sommelier experiente que participava da mesma degustação comparou aquele Aurora a grandes franceses da Borgonha, chamando atenção para o enorme potencial de guarda dele.
Inspirada pelo discurso e pelo preço de 25 reais, coloquei dois Pinot desses na mala. Em casa, o vinho não me provocou a mesma empolgação. Sim, eu acredito que circunstância e estado de espírito possam motivar percepções diferentes do mesmo vinho. E naquele dia, em meio àquele cenário, eu tava tão feliz! Dos três meses de carvalho o vinho herdou aromas defumados, de chocolate e especiarias. As frutas vermelhas estavam lá, no nariz e na boca. Mas me pareceram maduras demais. Ele já não era tão elegante quanto da primeira vez. No tripé que dita o equilíbrio, os taninos saíram na frente da acidez e do álcool (12,5%). Será que melhoraria se eu o tivesse decantado? 

Enfim, tem outro ali na masmorra, como diz o BK. O tempo me dirá e eu vos direi. 


Roberta Pakas 

Brasil na Taça: A Ancellotta do novo mundo


Demorou, mas saiu o post que há meses venho ensaiando escrever. Vamos ver se consigo postar com a mesma regularidade com que bebo. Para quem não me conhece, sou amiga do BK e do Samurai, jornalista, enófila e, justo por isso, sommelière, recém-diplomada.
Vou usar esse espaço já consagrado para falar, principalmente, das boas experiências que venho tendo com vinhos brasileiros. Neste blog pelo qual desfilam tantos rótulos bacanas eu acho que os brasucas não vão passar vergonha. Mas não me calarei, claro, diante dos gringos com os quais aprendi a gostar de vinho.
Diferentemente do que acontece, por exemplo, no Chile, a maioria dos vinhos brasileiros de qualidade não é produzida em escala industrial, daí, mas não só,  os preços que nos fazem titubear entre investir num nacional ou num importado. Seja por falta de referência ou reputação, quem arriscaria 35 reais num Chardonnay da Aurora, a mesma do Sangue de Boi, se ele dividisse prateleira com qualquer exemplar chileno de mesmo preço?
Apesar do evidente preconceito, percebo cada vez mais gente disposta a experimentar o vinho brasileiro motivada, entre outras razões, pelos elogios que vêm de fora, em especial dirigidos aos espumantes.
Vinho nacional nunca foi assunto lá em casa, sequer para ser achincalhado. É como se ele não existisse. Confesso que o "clique" foi dado durante uma viagem que fiz à Serra Gaúcha, onde visitei umas dez vinícolas. Empolgada, trouxe na mala, do "Brasil para o Brasil", 20 garrafas, entre as quais a de um Don Laurindo Ancellotta Reserva 2009. O General também pode falar sobre ele.
Dono e enólogo da vinícola, Ademir Brandelli é daqueles caras que, de tão confiantes no que fazem, carregam um certo ar arrogante. Ele recebeu a mim e a amigos na propriedade da família, que contempla residência, vinhedos e vinícola. Depois de cruzar a área que abriga os tonéis de aço inox, os barris de carvalho e a fria adega de pedra subterrânea, chegamos à lojinha onde degustaríamos seus vinhos. Eu consegui o feito de levar uma câmera sem cartão de memória dentro, logo, não tenho uma foto sequer.
Brandelli se gaba dos 15 hectares de vinhedos próprios e da relação íntima que tem com seu terroir. Contou cheio de orgulho que a colheita de todas as uvas é manual, seletiva e que 30 minutos depois de retiradas do pé elas já estão a caminho da "cantina", para que não que fermentem antes da hora ou sejam contaminadas. Ele também exibe como trunfo o fato de não fazer nenhum tipo de correção de álcool ou acidez em seus vinhos, prática permitida pela legislação brasileira. Por fim, não parece se importar em fazer vinhos para agradar o freguês. Está certo de que o que faz é muito bom, e que entende de vinho aquele que gosta do que ele faz. Simples assim.
Na vinícola, a terceira do dia, provamos cerca de 10 rótulos. Aliás, nessa viagem estabeleci fortes laços com aquele objeto estranho chamado cuspideira. A degustação custará 15 reais ao visitante que não levar nada. Eu trouxe duas garrafas, uma delas da uva Ancellotta, uma cepa italiana usada principalmente em lambruscos e que tem se adaptado muito bem à Serra Gaúcha.

Bom, vamos à garrafa de número 167 das 3000 produzidas. Deixei o Reserva 2009 decantando por 20 minutos, também para que os aromas se abrissem, mas principalmente pelo fato de o vinho não ter sido filtrado. Nenhum Don Laurindo é. Será que isso tem alguma relação com aquele super rubi brilhante que só o 3D conseguiria pintar? E o que era aquela geleia de frutas vermelhas maduras em estado líquido! O contra rótulo diz que esse Ancellotta é "de guarda". Um site especializado em vinhos brasileiros sugere consumi-lo em 5 anos. Voilà! Por isso os taninos e a acidez estavam mais bem casados do que jorge Amado e Zélia Gattai. Um vinho de corpo médio que coube direitinho nos 12% de álcool que tem, contrariando a ideia de que quanto mais etanol melhor. E o tempo em taça fez muito bem a ele, que ganhou umas notinhas de menta e uns aromas meio rústicos que me lembraram vinhos italianos mais evoluídos.


A conclusão é de que o vinho é bem bacana, apesar de 46 reais não ser o preço que eu gostaria de pagar.  Isso tira dele a chance de ocupar minha adeguinha como opções para o dia a dia. De qualquer forma, valeu cada centavo a experiência de provar um vinho artesanal e quase único no mundo, considerando o fato de ele ser 100% Ancellotta. Nem na Itália, seu berço, a uva é tão bem tratada quanto aqui, sendo usada apenas como coadjuvante em vinhos de corte.


Roberta Pakas