Brasil na Taça: Barberizando!


Se tem um vinho que eu aprendi a gostar no último ano é dos feitos de Barbera. A maioria dos que provei era leve, frutado, bem ácido e com os taninos prontinhos, bem do jeito que eu gosto. Mas dependendo da proposta do produtor, é possível que a Barbera resulte em vinhos com mais corpo e potencial de guarda.
 Obviamente, minhas incursões pelo mundo da Barbera começaram pela Itália. As denominações de origem mais famosas são as D'Alba, D'Asti e Monferrato, mas só experimentei os vinhos feitos em Alba, a preços que variavam entre 20 reais e 95 reais. Todas essas comunas ficam no Piemonte, onde a Barbera é a uva mais plantada, mas a mais famosa e prestigiada é a Nebbiolo.

Essa introdução é para dizer que eu provei um Barbera brasileiro, melhor, até, do que muitos dos italianos que mencionei. Já tinha visto nos supermercados o feito pela Perini e, apesar da curiosidade, resisti a desembolsar 35 reais por ele.

Na Serra Gaúcha, mais especificamente em Bento Gonçalves, fui até a Angheben para uma conversa agendada dias antes com Eduardo, enólogo e filho do mítico Idalêncio Angheben, considerado por muitos o melhor enólogo e viticultor do país. No próximo post, detalhes da história da vinícola e sua linha de produtos.

Eduardo Angheben. O enólogo da vinícola
Contou o Eduardo que até a década de 60 tinha um monte de Barbera no Vale dos Vinhedos, mas eram videiras plantadas a esmo e não raramente atacadas por vírus e fungos. De seus frutos foram feitos os vinhos que detonaram a reputação da uva. Contrariando o histórico desanimador, a Salvati & Sirena foi a vinícola brasileira pioneira na produção de bons Barbera. Tempos depois a Angheben também incluiu a uva em seu portfólio. Os resultados, segundo o Eduardo, são a cada ano mais surpreendentes. A safra 2012 é a sétima de vinhos desta uva feitos pela Angheben, um número ainda pequeno para cravar a qualidade média dos Barbera produzidos na Serra Gaúcha. Mas foram justamente os comentários entusiasmados sobre este vinho que me levaram até a vinícola.

40% do líquido estagiou em barricas americanas de segundo e terceiro usos, entre seis e sete meses. Esse tempo não é fixo, mas determinado por degustação. No nariz, os aromas defumados e de baunilha se mesclam ao frescor de frutas como morango, ameixa e cereja. Já que o Eduardo nos serviu vários vinhos, pude voltar na taça uns 40 minutos depois e notar que ela tinha sido invadida por um incrível perfume de tomate confitado. As frutas se percebem na boca também. O vinho tem persistência média e é mais encorpado do que os Barbera italianos que experimentei, e com uma acidez marcante que dá a ele até oito anos de adega.

Em casa, eu, que costumo mudar de opinião em relação aos vinhos que provo, só consegui gostar ainda mais do Barbera da Angheben. O prato que fiz para acompanhá-lo, de tão bom que ficou, deveria entrar para o hall das harmonizações clássicas: Sauternes com Foie Gras; Chablis com Ostras; Barolo com Ossobuco; Tannat com Cassoulet; Barbera com Nhoque de Mandioquinha submerso num molho de tomate, berinjela defumada e ricota, com bastante queijo e manjericão fresco.


Roberta Pakas

Brasil na Taça: Harmonizando com Estrelas do Brasil


Um espumante Nature que, no nariz e na boca, lembra aqueles vinhos envelhecidos em barris e com leve toque de oxidação, tipo Jerez, alguns fortificados e brandies. Some-se a isso a austeridade dos espumantes "zero açúcar" e temos um vinho que pode ser definido como de difícil compreensão e que precisa de uma certa dose de boa vontade do bebedor. 


O Estrelas do Brasil Nature 2007 foi feito pelo método tradicional e leva Chardonnay, Pinot Noir, Riesling Itálico e Viognier. A perlage exemplarmente pequenininha se debateu loucamente na taça por mais de 10 minutos em meio ao líquido tão dourado quanto o de cerveja pilsen. No nariz ainda mel, nozes e manteiga. Na boca é um escândalo de confuso! O General teria recuado não fosse minha insistência no conceito "experiência". Um detalhe importante é que eu gosto do Jerez Fino, ele não!
Mousse gorda, cremosa; acidez na medida; vinho compriiiido... Admitindo minha pouca experiência, diria que este é um espumante no mínimo especial e que seguramente recomendaria a um amigo. Mas diria a esse amigo que não se deixasse levar pelo o que está lendo e que não reclamasse por não sentir nada do que eu senti.


Irineo Dall'Agnol, o enólogo trabalhando em rede
É bom mencionar que o pai da criança, Irineo Dall'Agnol, discorda do meu jeito de ver seu vinho. A percepção é pessoal, o vinho não é consensual e ele sabe disso. Muito elegantemente, o enólogo opinou que o que eu entendi por "fortificado" e "oxidado" ele leu como "casca de laranja cozida". Explicou ainda que o vinho tem aromas terciários em profusão, que são fruto dos 60 meses que maturou sobre as leveduras.


Harmonizando Estrelas
Eu sabia que não seria um espumante fácil e por isso arrisquei harmonizá-lo com algo pesado para um vinho do gênero: um risoto de camarão com tudo o que dele é de direito: um poderoso e verdadeiro caldo de peixe, manteiga, parmesão e páprica picante. Finalizei com manjericão e tomatinho cereja. E não é que ficou bom! O espumante tinha a estrutura e acidez necessárias para segurar a untuosidade do prato.

Para deixar os leitores do BK ainda mais tentados, o Anuário Vinhos do Brasil 2013 deu ao Nature 2007 Champenoise de Estrelas do Brasil a melhor nota (91) dentre as 554 amostras de vinhos nacionais enviadas por 85 vinícolas.


Essa joiazinha custa 80 reais, e quem quiser "experienciá-la" terá de ligar para o Irineo e pagar pelo frete. Ou ir à Bento Gonçalves e buscá-la das mãos do autor, como eu fiz.


Roberta Pakas